O número alarmante de feminicídios em 2024 revela a persistência da violência de gênero no Brasil
De acordo com dados da Rede de Observatórios da Segurança, ao menos uma mulher foi morta a cada 17 horas nos nove estados monitorados: Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo. No total, foram registradas 531 mortes motivadas pelo gênero ao longo do ano, escancarando um problema que segue aumentando apesar dos mecanismos de proteção existentes.
A pesquisa apontou que, em 75,3% dos casos, os crimes foram cometidos por pessoas próximas às vítimas. Entre parceiros e ex-parceiros, a taxa chega a 70%, demonstrando que a violência doméstica continua sendo uma das principais ameaças à segurança das mulheres. Além disso, o boletim “Elas Vivem: um caminho de luta”, divulgado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), reforça que o cenário é ainda mais preocupante quando analisamos os casos de violência geral. Ao menos 13 mulheres foram vítimas de agressões a cada 24 horas nos estados analisados, totalizando 4.181 registros, um aumento de 12,4% em relação a 2023.
A situação varia entre os estados, mas todos compartilham um traço comum: o feminicídio e a violência de gênero seguem impactando vidas e demonstram a necessidade urgente de políticas públicas mais eficazes. No Amazonas, que passou a integrar o monitoramento em 2024, foram registrados 604 casos de violência contra mulheres e 33 feminicídios, sendo 15 cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Além disso, o estado apresentou um dado alarmante: 84,2% das vítimas de violência sexual tinham entre 0 e 17 anos.
Na Bahia, o levantamento mostrou uma redução de 30,2% nos casos de violência, mas os feminicídios continuam ocorrendo em grande número, com 46 assassinatos registrados. No Ceará, 2024 foi o pior ano em sete anos no que diz respeito à violência contra mulheres, com um aumento de 21,1% nos casos e 45 feminicídios. O Maranhão registrou um crescimento de quase 90% na violência de gênero, totalizando 365 eventos violentos e 54 assassinatos.
O Pará também viu um aumento expressivo, com uma alta de 73,2% nos casos de violência, sendo a maior parte dos crimes cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Em Pernambuco, o estado apresentou leve redução no número de registros, mas continua ocupando a segunda posição entre os monitorados com mais casos de feminicídio, totalizando 69 assassinatos. O Piauí registrou crescimento de 17,8% nos crimes ligados a gênero, com 237 casos e 36 feminicídios, além de enfrentar problemas na transparência dos dados, dificultando uma análise mais detalhada do problema.
No Rio de Janeiro, os casos de violência contra mulheres cresceram 1,9%, com 633 registros ao longo do ano. O estado também apresentou altos números de feminicídios e tentativas, além de 103 casos de estupro. São Paulo, por sua vez, foi o estado com mais de 1.000 registros de violência contra mulheres em 2024, chegando a 1.177 casos. A capital paulista lidera o ranking, seguida por São José do Rio Preto e Sorocaba. Foram registrados 144 feminicídios no estado, sendo 125 cometidos por parceiros ou ex-parceiros.
A pesquisadora Edna Jatobá, uma das autoras do relatório, destacou que, apesar dos avanços na institucionalização de mecanismos de proteção às mulheres, como as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), a Lei Maria da Penha e a tipificação do feminicídio como crime, a violência de gênero continua sendo um problema estrutural no Brasil. Segundo ela, o fenômeno tem sido tratado como apenas mais uma pauta social, e as políticas de assistência estão cada vez mais fragilizadas, o que contribui para o aumento dos casos.
Diante deste cenário, especialistas e organizações da sociedade civil reforçam a necessidade de ampliar o investimento em políticas públicas de prevenção e acolhimento às vítimas, além de garantir a efetividade dos mecanismos de proteção já existentes. O combate à violência contra a mulher exige uma resposta firme do poder público, bem como a conscientização da sociedade para romper com esse ciclo de agressões que vitimiza milhares de mulheres todos os anos.
Foto Tânia Rego/Agência Estado